Arêa Leão - Advogados Associados

Postado em 28/10/2020

A tipificação do dano extrapatrimonial é possível de ocorrer a partir do trabalho remoto ocasionado pelo afastamento nos locais físicos de trabalho em razão da pandemia de COVID-19?

GUILHERME DE LUCA - A lei n° 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista, ensejou um grande impacto nas relações juslaborais e que veemente modificou a vida de todos os trabalhadores regidos pela norma celetista, principalmente no que tangencia o teletrabalho e os danos extrapatrimoniais.

A mesma trouxe diversas modificações a serem aplicadas no instituto do dano moral, dentre elas, a inserção de um título inteiramente dedicado ao chamado "dano extrapatrimonial" (Título II-A), tal como inseriu o capítulo II-A, que dispõe unicamente sobre o “teletrabalho”.

Se não bastasse o impacto normativo, em poucos meses um fenômeno inesperado, que foi a ocorrência da COVID-19, modificou veemente todas as relações jurídicas e sociais, principalmente no âmbito do Direito do Trabalho, obrigando as empresas e empregados reinventarem as formas de labor, principalmente por meio do teletrabalho, gerando consequências nos seus institutos, tal como do dano extrapatrimonial.

Em razão da pandemia, em todo o mundo, diversos trabalhadores começaram a atuar de maneira diferenciada, para colocar em prática o necessário isolamento social, exercendo suas funções em suas respectivas casas, pois, dentre as diversas medidas anunciadas como atenuantes do impacto ocasionado pelo vírus, incluía-se na MP 927, de 22/3/2020, trazendo à tona a adoção do regime de teletrabalho (art. 3º, I). Consequentemente, implementou-se o modelo de home office nacional (art. 62, III, da CLT). E, é certo que a CLT, com a alteração promovida pela lei 13.467/17, contenha uma regulamentação sobre o teletrabalho (arts. 75-A a 75-E), a MP 927 trouxe nova disciplina ao conteúdo (arts. 4º e 5º).

O "dano extrapatrimonial", como o próprio nome diz, é aquele que decorre de relações não patrimoniais, ou seja, advém de relações existenciais e de direitos de personalidade. Portanto, tais danos extrapatrimoniais figuram-se como o sinônimo do dano moral. No tocante ao âmbito de aplicação, o novo artigo 223-A da CLT, deixa expresso que é cabível a reparação por danos extrapatrimoniais e que sejam decorrentes da relação de trabalho. Portanto, se finda qualquer questionamento, ainda que o trabalho ocorra de forma remota, sobre o cabimento do instituto na seara laboral.

A CLT, a partir do artigo 223-B, passa a definir que o dano de natureza extrapatrimonial será considerado todo aquele que ensejar em ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são as titulares exclusivas do direito à reparação.

O legislativo considerou na sua redação o que poderia ser classificado como ofensa moral ou existencial da pessoal, tanto que o artigo seguinte (Art. 223-C) define que a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa física. Portanto, há uma nítida tendência em consagrar e postular a dignidade humana.

Já o artigo 223-D, conceitua as hipóteses de dano moral em face da pessoa jurídica. Ou seja, a legislação trabalhista passa a considerar a possibilidade de dano moral praticado contra o empregador, tanto que qualquer ofensa quanto a imagem, a marca, o nome, o segredo empresarial e o sigilo da correspondência são bens juridicamente tutelados.

Em relação à responsabilidade, o legislador figura que será punido aquele que causar o dano extrapatrimonial para todos os que tenham colaborado para a ofensa ao bem jurídico tutelado, na proporção da ação ou da omissão.

É certo, também, que a reparação por danos extrapatrimoniais pode ser pedida cumulativamente com a indenização por danos materiais decorrentes do mesmo ato lesivo. Mas, se houver cumulação de pedidos, o juízo, ao proferir a decisão, discriminará os valores das indenizações a título de danos patrimoniais e das reparações por danos de natureza extrapatrimonial.

No âmbito do lar, o referido trabalho se fez necessário, de forma imediata em razão da pandemia, onde muitos trabalhadores tiveram que adaptar a sua rotina no âmbito do lar, destacando-se principalmente a ocorrência do denominado assédio moral por competência.

Tal modalidade é aquela onde o empregador imputa ao trabalhador o falso reconhecimento do seu trabalho, impondo uma maior carga de atividades, sob a falsa alegação de que o mesmo é capaz de cumprir, trabalhando além do que por sua vez cumpriria em condições normais.

Referida condição enseja desgaste físico, psíquico e mental ao trabalhador, sendo plenamente possível a reparação pela situação ora ocasionada, tal como previstas em arts. 186 e 927 do CCB; art. 5º, V e X, da CRFB; Convenção 190 da OIT; Anexo II da NR-17 da Portaria 3.214/87 do extinto MTE.

Embora a pandemia tenha modificado emergencialmente as formas de trabalho, as alterações significativas no modo de trabalhar nada altera no que diz respeito a possibilidade de ocorrência do dano extrapatrimonial, cabendo a implementação do teletrabalho de forma racional e principalmente equilibrada, evitando uma sobrecarga ao trabalhador, sob pena de ser praticado as modalidades de assédio moral e o dever de indenizar a parte lesada.



Guilherme de Luca
Mestre em Teoria do Direito e do Estado pelo Centro Universitário Eurípides de Marília - UNIVEM (2016) (CAPES/PROSUP); Pós- graduando em Direito do Trabalho e Previdenciário pela PUC - Minas Gerais; Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Eurípides de Marília - UNIVEM (2013); Pós-graduando em Marketing Digital pela Estácio (2020); Advogado, consultor e parecerista jurídico; Professor de Direito e metodologia em diversos cursos de pós-graduação lato sensu nas modalidades presenciais e EAD; Professor em cursos preparatórios para concurso público e OAB; Professor de Direito em Instituições de Ensino Superior Experiência em coordenação educacional e EAD; Palestrante.
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